As histórias bem-sucedidas do empreendedorismo geralmente reservam protagonismo para um visionário, que defende uma ideia não muito usual. Guardam, também, espaço para quem acredita nessas teses que o senso comum costuma desprezar. E esses personagens que depositam sua confiança nesses visionários são chamados, carinhosamente, de “malucos”. A história dos Vinhos de Inverno têm esses dois personagens muito bem caracterizados. Um deles é o produtor Murilo de Albuquerque Regina, presidente da Associação Nacional dos Produtores de Vinho de Inverno (Anprovin). O outro é o médico Marcos Arruda Vieira.
Essa saborosa, rica e decisiva história está devidamente registrada num documentário que acaba de ser disponibilizado ao público. Trata-se do filme “Vinhos, Cultura e Saberes no Sul de Minas: o alvorecer de uma nova vitivinicultura”. Ele foi produzido pelo coletivo Caves da Mantiqueira. Recursos do Fundo Estadual de Cultura de Minas Gerais bancaram a iniciativa. O documentário é um resgate da história da vitivinicultura no Sul de Minas Gerais. Ao mesmo tempo, joga luz na técnica da dupla poda, que está revolucionando o País, abrindo novas fronteiras para o vinho brasileiro.
A tradição da produção de vinhos de mesa na região é o ponto de partida do documentário. Mas a dupla poda entra no filme como um divisor de águas desse enredo vitícola.
Para contar a técnica da dupla poda, difundida pela Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig) quando Murilo era pesquisador da agência, o documentário entrevista a pesquisadora Renata Vieira da Mota.
Dupla poda
A técnica da dupla poda, adaptada pela Epamig, consiste na inversão do ciclo da videira pela realização de duas podas anuais, o que possibilita que a maturação e a colheita das uvas ocorram no Inverno, período com menor incidência de chuvas e elevada amplitude térmica (diferença de temperatura entre o dia e a noite).
A prática começou a ser testada no início da década de 2000, quando o então pesquisador da Epamig, Murillo de Albuquerque Regina, retornou de doutorado na França, onde avaliou que as condições necessárias para se produzir uvas sadias e aptas para a obtenção de vinhos finos eram bastante semelhantes às características climáticas do Inverno na região cafeeira do Sul de Minas.
Os primeiros vinhos obtidos pela técnica chegaram ao mercado no início da última década e logo conquistaram espaço no circuito gastronômico e prêmios em concursos nacionais e internacionais.
Na história narrada no documentário, Murillo é o visionário e o “maluco” é o médico Marcos Arruda Vieira, proprietário da Fazenda da Fé, no município de Três Corações, que abriu suas terras para a primeira experiência da técnica da dupla poda no Brasil. Murillo lembrou, em entrevista anterior ao site da Anprovin, como tudo começou. Ele recordou que, reunidos numa confraria de amigos, no final dos anos 90, após um jantar regado a vinho francês, foi perguntado pelo médico se dava para fazer vinho de qualidade na mineira Três Corações, com o mesmo nível daquele apreciado no encontro.
Murillo consentiu. “Sim, mas desde que a colheita da uva seja a partir de julho. Precisamos inverter o ciclo de maturação das uvas”, explicou. Marcos insistiu, perguntando o que era necessário. “O que precisa é de um maluco para apostar neste projeto”, cutucou Murillo.
O “maluco” abriu então as portas de sua propriedade e assim estava pavimentado o caminho para a bem-sucedida experiência dos Vinhos de Inverno
Enólogos e produtores
O enólogo Lucas Amaral participou da produção e falou sobre características próprias dos vinhos finos da região, mais alcoólicos e coloridos, que possuem grande potencial de envelhecimento e vêm se destacando em concursos internacionais. Também mencionou os testes que a Epamig tem realizado com novas variedades de videira e as possibilidades para o desenvolvimento do enoturismo na região.
Os vitivinicultores Procópio Stella (Vinícola Stella Valentino) e Carlos Marcon (Casa Geraldo) também deram depoimentos e contaram sobre a aposta na produção dos vinhos finos de Inverno e resultados já alcançados.
Equipe do filme
O roteirista Ricardo Souza disse em entrevista à Agência de Notícias Minas Gerais que o objetivo do coletivo Caves da Mantiqueira é promover a cultura e as riquezas da região. O grupo, que conta também com Rafael dos Santos (diretor do documentário), Antonio Gilmar Mangussi Filho (produtor executivo), Flávio de Paula Almeida (responsável pela captação e edição das imagens) e Andréia Testa Ribeiro (atriz, que narrou o documentário), pretende seguir nessa linha.
“Acreditamos que esse novo terroir possa ser um chamariz para outros produtos, para a ciência e para a cultura da região”, finaliza Ricardo.
Veja o documentário
Serviço
“Vinhos, cultura e saberes no Sul de Minas: o alvorecer de uma nova vitivinicultura”
Sinopse: A técnica agrícola da Dupla Poda, que consiste na inversão do ciclo da videira por meio da realização de duas podas por ano, tem possibilitado que os produtores cultivem vinhedos de origem europeia que antes eram impraticáveis na região do Sul de Minas Gerais. Desta forma, a fabricação de vinhos finos tem ganhado novo impulso em municípios sul-mineiros, com o surgimento dos “Vinhos de Colheita de Inverno”, cujo incremento potencializa o enoturismo, a gastronomia e o desenvolvimento do setor de serviços e de produtos agregados.
Direção: Rafael Santos
Roteiro e Pesquisa: Ricardo Luiz de Souza
Produção Executiva: Antônio Gilmar Mangussi Filho
Captação e Edição: Flávio de Paula Almeida
Voice Over: Andreia Testa Ribeiro
Gênero: Documentário
Duração: 15 min
Com informações da Agência Minas Gerais